sexta-feira, 29 de maio de 2009

Lições de Guardiola (Por Wilson Junior)

Lionel Messi é o melhor jogador do mundo na atualidade. Samuel Eto’o é o atacante com faro de gol mais apurado dos últimos tempos. Thierry Henry é qualidade com experiência nessa trinca de atacantes. Xavi Hernandez é o maestro e Andrés Iniesta está por toda parte, sempre onde deve estar. Daniel Alves é abusado na medida certa.

O Barcelona tinha todas as peças para se tornar o que a final da Liga dos Campeões o consagrou: o grande time da temporada, na Europa e no mundo. Mas foi além: encantou, jogou o tão proclamado ‘futebol bonito’ que os saudosistas e os apaixonados insistem em pregar. Neste ponto, mérito total de Josep Guardiola.

O técnico espanhol implantou o esquema com três atacantes na medida certa, soltando as feras aos poucos ao longo da temporada. E teve a coragem de manter seu ousado esquema numa decisão em jogo único contra a equilibrada equipe do Manchester United. Correu os riscos, colheu os benefícios. Equipe nenhuma no mundo pode se abrir contra uma trinca de frente que tenha Messi, Henry e Eto’o. E usá-los juntos muitas vezes é também uma forma de se defender.


O jogo bonito
É possível jogar bonito e ser vitorioso, mas os defensores do futebol de resultado não precisam se preocupar. Para que isso aconteça, é preciso ter as peças. Como tem o novo campeão europeu. Como tinha o Brasil na Copa de 70. Como tinha o Palmeiras de 1996, campeão paulista com Luxemburgo. E nem sempre é garantia de sucesso, vide a seleção brasileira em 82.

Além de ter as peças, é preciso saber usá-las. A seleção brasileira de 2006 tinha o melhor material humano dentro das quatro linhas. Ronaldinho Gaúcho, Kaká, Robinho, Adriano, Ronaldo, Juninho Pernambucano, Zé Roberto – todos em grande fase ou muito próximos dela. Veja se eles jogaram com a leveza do Barcelona atual?

Uma das principais diferenças entre aquela seleção de Parreira e o time de Pep Guardiola está na utilização dos espaços. O Barça abre o jogo. Daniel Alves estica na direita, Henry abre pela esquerda. O adversário tem que se espalhar e falta gente pra conter a habilidade do resto da turma, com a movimentação intensa de Messi, Xavi e Iniesta, alternando entre os dois lados do campo. Enquanto isso, o Brasil de 2006 parecia um time de pebolim – ou totó – com os jogadores engessados em suas posições.

Bota ponta, Dunga!
Como as águas passadas têm um ditado próprio para elas, vamos tratar de atualidade. Mais até do que seu antecessor, Dunga tem as peças para fazer o Brasil jogar como o Barcelona, numa edição reformada do: ‘bota ponta, Telê’. A equipe que conquistou a tríplice coroa na Espanha trouxe o argumento que eu esperava para defender o esquema de três atacantes na seleção brasileira – algo que amigos próximos classificam como “muito arriscado”.

A base do funcionamento do clube catalão é a movimentação. E o Brasil tem atacantes e meias com a leveza necessária para que ela aconteça. Robinho, Alexandre Pato e Nilmar são jogadores que podem atacar abertos pelos dois lados do campo, abastecendo o nosso Eto’o, que não seria Obina, mas Luís Fabiano (ou Ronaldo, quando estiver na forma que exige uma Copa do Mundo).

No meio-campo, temos a indispensável genialidade de Kaká, aliada a uma série enorme de Xavis e Iniestas abrasileirados. Para ficar nos mais jovens e já chamados pelo menos uma vez por Dunga: Ramires, Hernanes, Anderson, Lucas. Todos em plena condição de atacar e defender com a mesma competência e habilidade. Até o Elano pode fazer essa função, para agrado da teimosia do nosso treinador.

Defender é preciso
Alguns jogos, claro, exigem um pouco mais de cuidado na marcação. Para a final da Liga dos Campeões, por exemplo, a missão de carregar o piano barcelonista ficou com o pouco conhecido Busquets. Pode ser o pretexto para Dunga escalar seus Josués e Gilbertos Silvas, o que nos permitiria até liberar nossos laterais mais que os do Barça.

Outra lição de Guardiola está no cuidado com a defesa. O espanhol, que não é bobo nem nada, também cuida muito bem do setor. Repare que os ofensivos Sylvinho e Dani Alves raramente jogam juntos. Aliás, o canhoto só jogou contra o Manchester porque o dono da direita estava suspenso.

No Barcelona, um dos laterais é sempre mais defensivo. E a final da Liga dos Campeões teve o zagueiro Puyol cuidando da direita, enquanto o brasileiro Sylvinho se arriscava na esquerda. Cauteloso, mas sem abdicar do ataque. Mesmo sem muita manha, o capitão do Barça foi à linha de fundo pelo menos duas vezes e levou perigo à área do adversário.

O falso lateral
Transferindo a questão para a seleção brasileira, significa dizer que, para ter uma equipe mais leve e perigosa na frente, Dunga não pode escalar o mesmo Daniel Alves ao mesmo tempo que Kleber, Marcelo ou André Santos – nossas principais opções do lado esquerdo são altamente ofensivas. Ou seja, teríamos que escalar um lateral mais contido na canhota ou optar por Maicon, que sabe fazer bem essa função mais defensiva, pois já atuou várias vezes assim na Inter de Milão.

O recurso de utilizar um terceiro zagueiro como lateral disfarçado também funciona. No Brasil, vários técnicos já recorreram a esse artifício com sucesso, incluindo dois times que foram campeões no segundo semestre do ano passado. Em vários jogos do Internacional, o agora palmeirense Marcão fez a função de lateral esquerdo no time campeão da Copa Sul-Americana. Já o são-paulino André Dias foi por diversas vezes o lateral-direito de Muricy Ramalho, iniciando as ações ofensivas do Tricolor por aquele lado.

Sonho e realidade
Para a Copa das Confederações, Dunga tem a chance de armar um time com: Júlio César; Daniel Alves, Lúcio, Juan e Kleber; Anderson, Ramires e Kaká; Robinho, Luís Fabiano e Alexandre Pato (Nilmar).

Nada muito distante do Barcelona, campeão europeu. E falta de tempo para entrosar os jogadores não serve como desculpa. Mas não espere nada disso. O fato é que veremos três volantes menos ousados, com Kaká, Robinho e Luís Fabiano. Um time forte... mas de resultado, não de plástica.

Guardiola x Dunga
Pep Guardiola é um técnico jovem e que logo no início da carreira pegou um dos maiores clubes do mundo para comandar. Trajetória bem parecida com a de Dunga. Os dois foram volantes de destaque na década de 90. A diferença é que o técnico espanhol aprendeu com Johan Cruyff, enquanto o brasileiro aprendeu com Parreira.

Dizer que um foi campeão do mundo e outro não, seria comparar Romário a Raul. Ainda assim, Guardiola foi medalha de ouro na Olimpíada de Barcelona-92, marcando o gol do título. Dunga foi prata em Los Angeles-84 e já como treinador levou o bronze de Pequim-2008.

Usando a expressão mais do que batida, Guardiola fez de seus limões uma limonada. É possível que Dunga também produza algum suco. A diferença está no sabor. O espanhol soube dar um toque de açúcar. Já a bebida brasileira tende a ser servida com o amargo da casca e o azedume do limão.

Quem foi, foi. Quem não foi, fica. Admirando o Barça. Sofrendo com a seleção.

Wilson Junior é editor de esportes da Band.

Nota do blogueiro: Wilson Junior, também conhecido como Juninho Furacão (apelido dado pelo nosso Henrique Guilherme), iniciou sua carreira jornalística, ainda garoto, quando cursava o colegial, na equipe de esportes de Éder Luiz, na Band FM. Já naquela época, mostrava-se um grande entendedor de futebol. Aprendeu ainda mais com o tempo e a experiência profissional, como se percebe no belo e didático texto acima!

Um comentário:

William Nunes disse...

Thomaz boa tarde.

Parabéns pelo blog e pelo teu trabalho como jornalista. Sou um fã seu. O galera gol está cada vez melhor. Você realmente virou uma referência para este futuro jornalista que te escreve. Se você puder dê uma lida nos textos que escrevo para me exercitar.

Um grande abraço, William.

http://recantodasletras.uol.com.br/autores/williamnunes